ONDE TUDO COMEÇA

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quarta-feira, 11 de junho de 2014

SOBRE OUVIDOS ATENTOS E ESCUTAS AMOROSAS





“Certa ocasião, quando pela enésima vez eu tentava comunicar a minha namorada a específica textura do meu sofrimento, ela me interrompeu com um ar de cansaço. “O que você tem’, disse ela, medindo as palavras, “é uma manifestação particularmente dolorosa da condição humana básica. Mas você não é o único. Todo mundo sofre.” Intelectualmente, eu sabia que ela estava certa. Mas ainda queria que ela se chegasse mais a mim, que conhecesse visceralmente a minha angústia específica, para que eu pudesse fugir por um instante de minha desesperada solidão.”
(Marc Ian Barasch - em O Caminho da Cura)



LINFEDEMA, OUVIDOS AMIGOS, ABRAÇOS E MILAGRES


Não sou uma pessoa muito chegada a confissões de desespero. Não sei dizer se isso é bom ou ruim. Por um lado, acho que ser uma pessoa portadora de más notícias para os outros, sejam elas queixas pessoais ou tragédias de outrem é algo bastante desagradável.  Mas, por outro, penso que, em alguns momentos da vida, ficar calada, engolindo a própria tristeza e o próprio desespero não deve ser muito bom e nem fazer muito bem para quem quer que seja. Deve ser por isso  que as religiões criaram o sistema de confissão. Falar alivia a alma. Falar é curativo. E tudo o de que precisamos em horas difíceis é de ouvidos amigos e escutas amorosas. 


Apesar de não gostar de incomodar os outros com meus problemas, sinto que, quando nas minhas angústias, abro meu coração e conto o que está me desesperando, minha alma fica mais leve, meu espírito menos atormentado, meu pensamento mais claro e eu me sinto emocionalmente melhor. O problema é que nem sempre é fácil encontrar um ouvido amigo. Por outro lado também, tenho a sensação de estar incomodando. Ou de que as pessoas não estão interessadas em parar para ouvir. Ou porque estão com um pouco de pressa com algo mais urgente para fazer ou porque não estão muito dispostas a emprestar o ombro ou os ouvidos ou mesmo o colo. Ou porque elas mesmas já têm problemas demais as atormentando no seu limitado pedaço de chão. 


Mas esta semana eu estava tão mal emocionalmente, que tudo o que eu mais queria e de que precisava era de um ouvido amigo. Alguém que me desse colo, espaço para eu abrir meu coração e muito abraço. Eu estava pessimamente carente. E não via uma pessoa na minha frente com quem eu pudesse desabafar. De repente as pessoas estavam lá e até disponíveis, eu, porém, fechada dentro de mim mesma, não conseguia enxergá-las. E aí me deu vontade de morrer! A loucura em mim se instalou rapidamente. E pensei: a hora é essa! Nada mais tenho a fazer nesse mundo. Já cumpri todas as minhas etapas. Está na hora de ir embora. E nesse desespero, nessa angústia toda, nessa depressão que me abateu, eu chorava... chorava... chorava... Me olhava no espelho e chorava mais ainda... Nada, coisa alguma parecia me alegrar ou fazer sentido. Eu me sentia muito cansada. Eu me sentia como se tivesse mil anos, como naquela música do Raul Seixas. Eu me sentia muito velha e encurvada. E tudo ficava lento e arrastado. E me sentia lenta e arrastada. Sem vontade de me levantar da cama. Dar quaisquer passos, andar era dífícil. Era pesado. O dia lindo lá fora, de um sol de outono de uma luz intensa e amena, um céu lindamente azul e sem nuvens, pássaros cantando, folhas se agitando ao vento e eu... cinzenta, triste, abafada, sem ar, sem cor, sem brilho, sem vontade, sem desejo... Sem vontade até de comer! Acho que bem poucas  vezes me senti assim. Se é que me senti alguma vez totalmente assim. No geral, sou da luta. No geral, sinto raiva e reajo, brigo, vocifero, grito... E é essa força que me faz seguir adiante acreditando em dias melhores. Sem ela eu me quebro, como agora, naquele dia de ontem. 


Mas nada acontece por acaso. Ou seja, todos esses sentimentos de desânimo não brotaram do nada. Na verdade, eles já estavam sendo “fabricados” dentro de mim. Há dois anos venho nessa batalha da recidiva. Tem sido um caminho longo, mas que tenho trilhado com bastante ânimo e fé e coragem para seguir adiante. Há dois meses, porém, venho lutando contra um linfedema que se instalou em meu bracinho complicado pela retirada de linfonodos. Nunca em tempo algum anterior eu tivera problemas nessa área. Meu corpinho inteligente sempre deu conta do recado. Mas, agora, de repente, não mais que de repente, sem prévio aviso, as coisas dispararam no sentido contrário. E... o linfedema rapidamente se instalou. No início achei que rapidamente também daria conta dele. E todos os sinais indicativos eram de que tudo iria rolar nesse sentido. Mas... qual o quê! As coisas foram se tumultuando. E as drenagens linfáticas não conseguiram dar conta do recado. E uma ameaça de erisipela começou a se evidenciar e... o fato é que entrei no antibiótico, no antiinflamatório, mais dez mil cremes hidratantes e mais venalot em creme e comprimido e mais todos os chás alternativos possíveis e imagináveis. E tudo isso regado com muita energia, muita boa vibração, muito pensamento positivo, muita fé e crença de que a “tempestade” iria passar. Mas... qual o quê! Já lá se vão dois meses e essa coisa não vai embora e eu estou perdendo as esperanças, com vontade de fugir, com vontade de sumir, com vontade de M-O-R-R-E-R! E tudo o de que consigo me lembrar é o ditado que minha mãe gostava de dizer: - Quanto mais reza, mais assombração aparece!


Ontem à noite, deixei cair o véu, despi-me das fantasias de "a forte e a poderosa" e quando minha filha chegou, eu que nunca gosto de preocupá-la, acabei deixando rolar um pedaço de toda essa profunda angústia e sentimento de desamparo. E ela amorosamente me abraçou, me beijou, me confortou, me ofereceu ajuda e foi dormir junto de mim. Me senti acolhida e amada. Hoje acordei ótima e profundamente renovada e cheia de esperanças e pronta para a luta novamente, cheia de novos planos de combate para este linfedema que tenho certeza irá desaparecer por obra e graça de um corpo que é inteligente, possui sua própria sabedoria e é divino por natureza.  E como acredito tanto em bruxas quanto em milagres, alcançar essa bênção É SÓ UMA QUESTÃO DE TEMPO!E EU AINDA VOLTO AQUI PARA CONTAR!